O pânico de recessão tomou conta das bolsas de valores na última quarta-feira (14). A razão foi o temor envolvendo a guerra comercial entre China e Estados Unidos e a saúde da economia global.
Os três principais mercados de ações americanos fecharam em queda de 3%. Com isso, analistas apontam sinais de que os EUA podem estar em recessão.
No Brasil, a Bovespa despencou, fechando o dia em queda de 2,94%. O dólar avançou e fechou em 4,038 frente ao real brasileiro.
Os mercados europeus já estavam assustados com as notícias de que o PIB da Alemanha recuou no segundo trimestre. Além do crescimento industrial da China ter atingido, em julho, o menor patamar em 17 anos.
O FTSE 100 (índice com cem papéis importantes negociados na Bolsa de Londres) fechou em queda de 1,5%. Enquanto Bolsas na Alemanha e na França perderam mais de 2%.
Um novo ataque do presidente Donald Trump ao Banco Central americano ajudou a alimentar a corrida por ativos mais seguros. Um exemplo desses ativos é o ouro, que subiu mais de 1%.
Mas um dos maiores temores veio dos sinais emitidos pelo mercado americano de títulos. O rendimento dos títulos do Tesouro de 2 e de 10 anos inverteu-se pela primeira vez desde junho de 2007.
Esse fenômeno, chamado de inversão da curva de juros, é visto como indicador confiável de uma recessão ou forte desaceleração.
O índice de volatilidade CBOE, o chamado “índice do medo”, saltou 4,26 pontos, para 21,78. Todos os 11 setores principais do índice S&P 500 estavam no vermelho, com os segmentos de energia e de financiamento sofrendo a maior perda percentual.
Bancos também caíram fortemente, como o Citigroup (mais de 5%).
Como o Brasil foi impactado?
O Brasil não escapou da turbulência dos mercados internacionais. O principal índice do mercado de ações do país, o Ibovespa, caiu 2,94%, chegando a 100.258 pontos. Essa foi a maior baixa em um só dia desde março, quando a queda foi de 3,57%.
O movimento também afetou o dólar comercial. Ele subiu 1,85%, chegando a R$ 4,041 na venda, antes de recuar para R$ 4,038 no encerramento. A moeda americana estava abaixo do patamar de R$ 4 desde maio.
O avanço da reforma da Previdência e a pauta econômica no Congresso não foram suficientes para conter a queda da bolsa e a alta do dólar.
Estima-se que a sessão de promulgação da reforma do sistema previdenciário ocorra até 10 de outubro.
O governo de Jair Bolsonaro deve divulgar na semana que vem, também, um pacote que inclui uma ajuda a Estados e municípios.
Quem são os ‘culpados’?
Trump novamente tentou jogar a turbulência do mercado para o Banco Central americano e sua política de taxas de juros. Ele chamou o presidente da instituição, Jerome Powell, de “sem noção”.
Para o mandatário americano, ao elevar as taxas de juros quatro vezes no ano passado, o Banco Central dos EUA “agiu rápido demais, e agora está muito, muito atrasado” em cortar os custos dos empréstimos.
Pouco antes, o conselheiro de comércio da Casa Branca, Peter Navarro, disse à Fox Business Network que o Banco Central dos EUA deve cortar as taxas em 0,50 ponto percentual “o mais rápido possível”, uma ação que, segundo ele, levaria a uma alta das Bolsas de Valores.
Os EUA chegaram a anunciar o adiamento de uma nova leva de tarifas sobre importações chinesas. Mas o protelamento fez pouco para aliviar a tensão global.
“A questão é que a política comercial de Trump se mostrou tão errática que não se consegue mais aliviar a sensação de incerteza”, disse Tim Duy, professor de Economia da Universidade do Oregon.
No ano passado, o Banco Central dos EUA tinha um prognóstico relativamente otimista para a economia, com a perspectiva de que o estímulo do pacote econômico de US$ 1,5 trilhão (com corte de impostos e gastos) capitaneado pelo governo Trump sustentasse o crescimento e justificasse taxas de juros cada vez mais altas (medida que serve, por exemplo, para conter uma alta da inflação).
Apesar da turbulência, Trump pretende colocar a economia no centro de sua campanha à reeleição em 2020.
Em entrevista para a Fox Business Network na sexta-feira, a ex-chefe do Banco Central americano Janet Yellen disse que achava que a economia dos EUA permanecia “forte o suficiente” para evitar uma recessão, mas “as chances claramente aumentaram e chegaram a um patamar que sinceramente me deixa desconfortável”.
O que é a curva de juros invertida?
A “inversão da curva de juros” significa que os empréstimos por 10 anos são mais barato do que por 2.
É um patamar incomum e muitas vezes antecede uma recessão ou pelo menos uma desaceleração significativa no crescimento econômico.
Este sinal de alerta vem do mercado de títulos, o lugar onde governos e empresas vão para pedir dinheiro emprestado.
Um título é uma promessa de fazer certos pagamentos no futuro, geralmente um grande repasse quando o título “amadurece”.
O valor que os investidores pagam pelo título determina o rendimento que obterão. Quanto maior o preço, menor o rendimento.
Um fator que afeta o rendimento que os investidores miram é quanto tempo eles têm de esperar pelo pagamento final.
Normalmente, uma espera mais longa significa que eles aguardam um rendimento maior.
Isso é uma recompensa por amarrarem o seu dinheiro por mais tempo, quando há mais risco de que uma inflação inesperada possa erodir o valor de seus retornos.
A curva invertida é um sinal confiável de recessão?
É incomum o rendimento dos títulos de 2 anos subirem acima do rendimento no equivalente a 10 anos. Isso ocorreu no Reino Unido como também nos EUA.
Isso é visto como sinal de que os investidores querem o retorno garantido de manter um título de longo prazo. No entanto estão preocupados com as perspectivas de curto prazo para a economia.
Mas a curva de rendimentos invertida é confiável? Períodos com curva de juros invertida são seguidos de forma confiável por desacelerações econômicas e quase sempre por uma recessão. Quem afirma isso são os economistas do Banco Central dos EUA.
O tempo entre a inversão e o início de uma recessão não é, no entanto, uniforme.
Mas desta vez pode ser diferente?
Há algo no cenário atual que não se aplica aos episódios anteriores: a flexibilização quantitativa, a política adotada por muitos bancos centrais após a crise financeira (e antes, no caso do Japão) de comprar ativos financeiros, principalmente dos títulos de governos.
Isso teve o efeito de elevar os preços dos títulos, o que, vale lembrar, equivale a reduzir o rendimento deles. Então, a medida pode muito bem-estar contribuindo para a inversão da curva de juros atual.
A inversão da curva de juros não diz nada sobre quais podem ser as razões específicas para qualquer recessão iminente.
O que deixa os mercados tão nervosos?
Desta vez, existem várias possibilidades. O conflito comercial global é um fator que afeta muitas economias.
Muitas empresas (embora não todas) e investidores estão preocupados com a possibilidade de um Brexit sem acordo. Isso significaria a saída do Reino Unido da União Europeia sem que haja um acerto sobre transição.
O Reino Unido acaba de registrar um trimestre de declínio da atividade econômica. Então a ideia de uma recessão iminente não é de todo fantasiosa. Ainda que os números tenham influência da estocagem antes das datas planejadas do Brexit e o subsequente desfecho dessas ações.
Nos EUA, seria preciso uma desaceleração extra significativa para produzir uma recessão.
A Alemanha também registrou um trimestre de queda da atividade, de acordo com novos números. Então uma recessão também poderia estar ocorrendo lá.
A curva de rendimento para o governo alemão não está invertida. Mas há algo mais sobre os títulos do governo que é um sinal claro de perspectiva econômica fraca. Neste caso, os rendimentos estão abaixo de zero.
Por consequência, os investidores pagam ao governo para emprestar a ele. Isso reflete a política de taxas de juros ultrabaixas do Banco Central Europeu. Além de ser um sinal de uma perspectiva econômica fraca.