Escola Dominical – Comentário de apoio da Lição 5, do 4º trimestre de 2020 – O Lamento de Jó.
Aniel Ventura
Não temos como não admirar a história do patriarca Jó, ele se comportou de maneira irrepreensível diante de todas as tormentas que vivera. Tivera ele a necessária humildade e ousadia de lançar-se em terra, e adorar a Deus. Entretanto, o autor sagrado adianta que, em tudo isso, Jó não pecou contra o Senhor (Jó 1.22). Porém, agora, já desfigurado pela doença e em tudo uma pavorosa ruína, põe-se a amaldiçoar o seu dia natalício. E ele não o faz em oculto, mas, abre a boca em lamento diante de seus três nobres amigos: Elifaz, Bildade e Zofar.
I – PRIMEIRO LAMENTO DE JÓ: POR QUE NASCI? (3.1-10)
Segundo F. B. Meyer, Jó amaldiçoa literalmente o dia de seu nascimento. Porém, em momento algum, desfere qualquer palavra contra o Senhor. Jó abre a boca com uma maldição, mas nada diz contra Deus, como Satanás esperava. Ele não amaldiçoa Deus e sim o dia do seu nascimento, pedindo que sua existência despojada e sofredora possa terminar o mais depressa possível.
“Amaldiçoem-na aqueles que amaldiçoam o dia” (Jó 3.8), Jó empregou um verbo no hebraico diferente do que foi utilizado em “…amaldiçoou o seu dia”… (Jó 3.1), embora ambos foram traduzidos para o português como amaldiçoar. No entanto, no auge de sua dor, ele parece desejar possivelmente que aqueles que amaldiçoam o dia, ou seja, os que esconjuravam feitiços a pedido de seus clientes, pudessem ter lançado um feitiço para que ele nunca tivesse nascido. A crença de Jó num único Deus mostra que ele estava falando de forma poética e dramática (Jó 31.26-28). Ele não estava apoiando qualquer tipo de mágica, mas empregando termos vívidos e fortes para expressar a intensidade de sua agonia e desespero.
O maior desejo de Jó era desfrutar da presença e do favor de Deus; agora, acontecera aquilo que ele mais temia, parecia que Deus o abandonara; e ele não tinha a mínima ideia da razão disso. Mesmo assim, Jó não blasfemou contra Deus; continuou orando a Ele, rogando sua misericórdia e socorro (6.8,9). Seu lamento era uma expressão de dor e desolação e não uma expressão de revolta contra Deus.
II – SEGUNDO LAMENTO DE JÓ: POR QUE NÃO NASCI MORTO? (3.11-19)
Jó queixou-se daqueles que presenciaram o seu nascimento pela terna atenção que lhe deram. Somente o ser humano vem a este mundo de modo tão indefeso, no entanto o poder e a providência de Deus sustentam nossa vida frágil, sua piedade e paciência garante a nossa existência. Desejar morrer para estar com Cristo e ficar livre do pecado, é o efeito e a evidência da graça; porém, desejar morrer somente para estar livre dos problemas desta vida, não encontramos aprovação no novo testamento, pois Jesus mesmo disse “No mundo tereis aflições…” (Jo 16.33).
A graça nos ensina que em meio às melhores situações de nossa vida, devemos estar preparados para enfrentar a morte, e em meio aos maiores sofrimentos, não devemos desistir de viver. Entretanto para Jó tudo estava oculto, e não sabia porque Deus contendia com ele.
É dever de todo cristão buscar a sabedoria divina e aproveitar o melhor do que existe, seja através da vida ou da morte, e assim estar conscientes de que devemos viver para o Senhor, e também morrer para ele, pois em ambos casos somos dele (Rm 14.8).
III – TERCEIRO LAMENTO DE JÓ: POR QUE CONTINUO VIVO? (3.20-26)
Jó questionava o fato de estar vivo, porém, não estava pensando em suicídio. O contexto dos demais trechos do livro sugere nas entrelinhas que ele simplesmente desejava que o Senhor lhe permitisse morrer (Jó 7.15 – 21; 10.18-22; 3.23-26). O lamento de Jó foi porque Deus o cercara de tal forma que ele não poderia morrer. A ironia está no fato de que Jó percebeu que Deus o cercava de proteção, e ocultou (3.23) isso para mantê-lo afastado do desejo de morrer, um sentimento comum entre os que estão em sofrimento.
Jó talvez ignorasse, naquele momento de repassadas angústias, era que tanto o dia de seu natalício quanto o daquela agonia haviam sido feitos por Deus. Portanto, que se regozijasse neles! Paulo, recomendou aos filipenses, em diversas ocasiões, a se alegrarem no Senhor (Fp 4.4).
Com sabedoria espiritual, Jó aceitou resignadamente todas as provações que foram permitidas pelo Senhor. Recebeu o dia da abastança, por que recusaria o dia da carência? No primeiro havia alegria; por que não poderia haver regozijo também no segundo? Todavia, é o que professa o salmista, louvando ao Senhor pelo fato de o haver livrado de todos os seus inimigos, assim canta o rei Davi: “Este é o dia que fez SENHOR; regozijemo-nos e alegremo-nos nele” (SI 118.24)
CONCLUSÃO
Assim declarou o inglês William Shakespeare através de um de seus personagens: “Um dia assim tão feio e tão bonito, não vi jamais”. Assim também o dia da provação de Jó. Um dia que, apesar de feio, mostrava-se bonito. Embora naquele momento de provação, o patriarca tudo achasse desfigurado e cinzento, a verdade é que, aos olhos de Deus, havia uma indescritível beleza em toda aquela dor, e um colorido em todo aquele ardentissimo crisol. Um dia como aquele de Jó, acredito que ser humano jamais poderá ver.